A síndrome de Caim
Eu acredito que Caim e Abel existiram, foram personagens históricos. Alguns, mais céticos, acham que é apenas um mito para explicar o primeiro homicídio em uma guerra travada entre os que cultivavam a terra e os que caçavam. Caim invejou Abel e o matou.
O certo é que a revolta de Deus com Caim foi também sua frágil tentativa de esconder o fato de ter matado seu próprio irmão. Fato comum a qualquer homicida. Diante de um tribunal ele mente, mente e mente tentando ocultar a marca, ou seja, a síndrome deixada por Deus. Não tem como. Está no meio da testa. É a sua essência. Todo mundo vê.
Recordo-me que por ocasião dos 20 anos da morte de Chico Mendes, o jornalista Sílvio Martinello fez uma observação em sua coluna diária, Gazetinhas, no jornal A Gazeta, sobre uma declaração de Darly Alves:
_ Não matei o Chico Mendes. Ele que se matou.
Sílvio respondeu mais ou menos assim:
_ Ele não mudou. Continua o mesmo assassino de há 20 anos. Suas terras deveriam ter sido desapropriadas e transformadas em pequenas propriedades para os seringueiros.
Creio que a indignação de Sílvio foi porque não viu naquele homem nenhuma fresta de luz de arrependimento pelo crime cruel executado pelo filho a mando dele.
Por que eles não mudam? Não se arrependem? Choram e esturram de ódio, mas não clamam por misericórdia para libertar suas almas do cativeiro. O que impede um homem de gritar em uma madrugada qualquer da sua miserável e maldita vida: eu fiz, eu matei, eu errei, eu menti, senti inveja, ódio contra meu irmão...
Ao usar as palavras para dizer que Chico Mendes se matou, Darly continua tentando matá-lo mil vezes, um milhão de vezes. Um coração apodrecido e tomado pela inveja e pelo ódio. Ele continua o mesmo, o velho homem dentro dele não quer mudar.
Caim representa a inveja, a amargura, o rancor, o ódio e o instinto assassino; Abel a pureza, a inocência, o sacrifício e o amor.
Jesus disse que nós não devemos temer os que podem matar o corpo, mas o que pode destruir o que temos de melhor: a nossa alma.
Fisicamente Chico Mendes morreu. Porém, em a cada árvore em pé que Darly encontra pelo caminho ele o vê. Por mais que ele tente não vai conseguir matá-lo. Teria que assassinar todos os “Chicos” da cidade e da floresta. Teria que destruir toda fauna e toda flora. Teria que matar todos os sonhos sonhados pelos Chicos.
Segundo o Nazareno, todo aquele que odeia e inveja seu semelhante tem um assassino dentro dele. Quando invejamos alguém nos igualamos a Caim e ao pior dos assassinos porque queremos matar sua imagem, seus sonhos, seu sorriso, sua graça e ternura. Sua vida!
Por que eles não mudam? É a pergunta que continua martelando na minha cabeça. Talvez tenham a síndrome de Caim. Deus não precisou prender Caim, ele já estava preso a Abel, seu semelhante.