_ Me dê um prato de comida ou ao menos um pedaço de pão para saciar minha fome. Moço, lhe peço pelo amor de Deus...
_ Se você tivesse aproveitado sua juventude trabalhando não estaria aqui pedindo esmolas. Não lhe dou nada, nem água e vá se embora daqui.
Ao ver aquela cena caí de joelho naquela terra esturricada e castigada por anos de seca, levantei os olhos e as mãos para os céus e bradei:
_ Meu Deus me tira desse lugar. Quero ir para um lugar aonde Deus andou. Do jeito que vai eu e meus irmãos não vamos se criar.
Tinha só dez anos de idade mas jurei naquele dia que ía embora de Patú, Rio Grande do Norte, para um lugar em que Deus andou. Vi meu pai desmaiar de fome segurando no cabo de uma enxada no meio daquele sertão seco.
Certa vez, minha mãezinha fez uma farofa bem salgada para acompanharmos o pai no trabalho, eu e meus cinco irmãos. Ela disse que quando batesse a sede a gente ía beber muita água e não ía sentir fome. Aguentei até aos 17 anos.
Depois parti para o Ceará. Lá trabalhei no pesado. Dormia em um barraco feito de papelão atrás da construção em que trabalhava. Passei fome no Ceará, mas sempre dizendo para Deus: "Quero ir para um lugar aonde Deus andou".
Embarquei em um navio em Fortaleza, passei por Belém, Manaus e em uma sexta-feira, às três horas da tarde de 1943 desembarquei no Acre. Quando vi o verde da mata, a chuva abudante, a terra virgem e boa para se plantar disse a mim mesmo: Nessa terra Deus andou.
Fui seringueiro, agricultor, mas fiz a vida mesmo vendendo carvão. Naquela época pobre cozinhava na lenha, o carvão era para os ricos. Fiz dinheiro com carvão. Abastecia o Palácio do governo de carvão. Consegui uma terrinha pequena, mas com o dinheiro do carvão fui comprando a terra dos vizinhos.
Depois de anos de trabalho junto com meus filhos comprei um caminhão financiado pelo Banco da Borracha. Chegeui de São Paulo com esse caminhão na época de uma campanha eleitoral e o Guiomard Santos alugou. Em apenas um mês ganhei dinheiro para pagar o caminhão todo. Depois com meus filhos comprei mais outro caminhão e começamos a melhorar de vida na terra que Deus andou.
Hoje estou com 85 anos. Estou ruim da coluna devido uma vaca que me derrubou e pisoteou dentro do curral, depois levei uma queda do alto de uma escada de mais de três metros. Pensei que ía ficar entrevado em uma cadeira de roda, mas Deus foi bom para comigo. Ando devagar e com bengala. A maior dor que senti foi quando perdi meu filho, o João Dantas. Minhas filhas estão bem. Tem uma que mora no exterior...
A maior alegria que tive foi depois de mais de oitenta anos ter voltado ao Patú, no Rio Grande do Norte, na igrejinha em que minha mão me batizou, lá no alto da Serra. Fui agradecer a Deus por ter me trazido para a terra que ele andou.
Ouvi essa história contada em poucos minutos pelo seu Joaquim Dantas na casa de sua filha Marinete Dantas. Nos reunimos no dia da criança. A Marinete fez um voto a Deus para abençoar crianças no dia 12 de outubro pelo fato de seu pai não ter ficado em cadeira de rodas, depois de ter sido derrubado, chifrado e pisoteado pela vaca quando ele tirava leite.
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